Vapor Barato

A fumaça invadia as suas narinas, mas ela não parou de ler seu livro. Depois de uns minutos, seu nariz ardia a nicotina.
"Eu sabia que você voltaria", ela pensou, presunçosa e quando finalmente levantou a cabeça não conseguiu enxergar nada além da fumaça que lentamente desaparecia em formatos abstratos no ar. Ela olhou para os lados e só havia uma menina sentada na outra ponta do banco, quando esta percebeu que estava sendo observada, resolveu perguntar entre tosses:
- Desagradável esse lance de fumarem perto dos outros não é mesmo?
Ela só acenou com a cabeça, se fosse há alguns anos atrás, ela faria o discurso mais apaixonado do mundo sobe os males do cigarro, mas atualmente o cheiro trazia mais lembranças do que revolta.
E de repente, ela percebeu que demorou décadas pra ela descobrir quem realmente era e apenas alguns dias pra desejar o que mais odiava, porque hoje em dia ela era louca para ser acometida por aquele cheiro tóxico de cigarro novamente, só pra lembrar da toxicidade do relacionamento que ela tinha com ele.
A garota que estava ao seu lado, parou de tossis e disse bem amigavelmente:
- Qual seu nome?
- Alice, e o seu?
- Bruna. - ela chegou mais perto - Eu vi que você  nem ligou pro cheiro né?
- Me traz algumas lembranças, já me incomodei mais.
- Essa é a droga, né? Literalmente.
Alice só riu, queria rir para não chorar, para não procurar incessantemente o fumante que tão cuidadosamente havia posto aquele turbilhão de lembranças em sua mente, queria que fosse ele, que ele estivesse tentanto machucá-la só pra continuar tendo algum vínculo, nem que fosse mais tóxico que o cigarro que ele consumia tanto.
- Alice?
- Sim?
- O menino que tava fumando passou bem na sua frente, você não percebeu?
Alice arregalou os olhos.
- Não, como ele era? - ela sentia seu sangue borbulhar e borboletas fazendo algum motim dentro de seu estômago.
- Bonito, não deu pra ver bem por causa do fumaceiro, ele tava com uns três ou quatro outros meninos que também estavam fumando. - Bruna sacudiu a cabeça e disse - Mas ele queria ser notado por você, acho, senão não teria pedido pra eu te dar isso quando você saísse do seu transe.
Transe, ela de repente se lembrou que ele dizia que ela entrava em transe quando lia algo interessante, queria gritar, chorar e rir ao mesmo tempo. Bruna lhe entregou um pedaço de papel que dizia:
" Talvez eu volte, um dia eu volto, mas eu quero esquecê-la, eu preciso, ó, minha grande obsessão"
- Eu particularmente teria escrito algo sozinha. - disse Bruna, talvez já se achando íntima.
- Às vezes uma música consegue expressar melhor do que a gente consegue dizer ou escrever. - os olhos de Alice estavam marejados. - E vai ver é melhor assim, não é? Pra gente não dar mais importância ao que a gente quer esquecer e sabe que é importante.
- É... - Bruna passou a mão pelas costas de Alice - Talvez esquecer seja menos doloroso do que remoer.

Comentários

  1. Ai, migs, esse me fez chorar de vera :~
    (e eu que achava que meu estoque lacrimal tinha se esgotado rs)

    "Ela só acenou com a cabeça, se fosse há alguns anos atrás, ela faria o discurso mais apaixonado do mundo sobe os males do cigarro, mas atualmente o cheiro trazia mais lembranças do que revolta."

    Ouch

    "E de repente, ela percebeu que demorou décadas pra ela descobrir quem realmente era e apenas alguns dias pra desejar o que mais odiava, porque hoje em dia ela era louca para ser acometida por aquele cheiro tóxico de cigarro novamente, só pra lembrar da toxicidade do relacionamento que ela tinha com ele."

    Ouch [2]

    Lindo! <3

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